David acorda pela centésima vez. São cinco horas e
o Sol ainda não nasceu. A ansiedade não o deixa pregar olho. Ao fim de dez anos
de espera, é hoje que a volta a ver. Levanta-se e dirige-se à janela do hotel.
A primeira claridade do dia revela os contornos de Bagdade, cidade que hoje se
ergue das cinzas em que a deixaram. David foi piloto da Força Aérea Americana
na Guerra do Golfo e foi aí, num campo de refugiados no Kuwait, que a viu pela
primeira vez. Anisha destacava-se pela sua personalidade vincada, alegre,
espalhafatosa. Chegou àquele campo perdida do marido que a maltratava. Nos
meses que David ali passou em missão, apaixonaram-se, mas ele foi mandado
regressar de urgência e quando voltou já Anisha havia partido. Contaram-lhe que
o marido a encontrou e voltaram a Bagdade. Nenhum registo, nenhuma morada,
apenas um nome. Hoje, dez anos volvidos, David regressa ao teatro de guerra. Finalmente
descobriu o paradeiro de Anisha por intermédio de Frank, um amigo que lá deixou.
Ela procurou-o em desespero, contando-lhe que o marido a tratava cada vez pior
e que temia pela sua vida. Tomou-lhe apenas um mês a preparar tudo para a tirar
dali para fora. Hoje era o dia. Lá fora, a claridade aumenta, preguiçosa,
desafiadora.
- Acorda,
Frank, está na hora. – diz-lhe David, tocando-lhe ao de leve.
(continua)
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